Mortes por câncer caem no Brasil, mas motivo é falta de diagnóstico
O Brasil registrou queda do número de óbitos por câncer durante a pandemia, de acordo com os dados do Radar do Câncer divulgados durante o 12º Fórum Nacional Oncoguia, realizado virtualmente nesta terça-feira (26).
Os números, na comparação entre 2019 e 2021, revelam uma redução de 6,4% das mortes por câncer de mama; 6,6% por câncer de próstata; 8,1% por câncer de traqueia, brônquios e pulmão; 10,3% por câncer de esôfago; 13,4% por linfoma de Hodgkin; e 13,7% por câncer da cavidade oral.
O medo do contágio pelo coronavírus e o direcionamento dos serviços de saúde para o combate à pandemia são as principais causas do declínio dos números de rastreamento de casos de câncer no Brasil.
Em entrevista ao R7, o oncologista Robson Ferrigno, médico especialista em radioterapia da BP – Beneficência Portuguesa de São Paulo, explica que o câncer é uma doença de crescimento rápido e que a falta do diagnóstico precoce, ou a interrupção do tratamento, reduz consideravelmente as chances de cura do paciente.
“Outro impacto com que ficamos estarrecidos é que alguns pacientes interromperam o tratamento e foram para casa. Com certeza, a doença também progrediu nesses pacientes, que perderam a chance de ficar curados. É o que nós chamamos das mortes indiretas pela pandemia, difícil de ser mensurada, mas muito presente na nossa prática clínica”, afirma o médico.
Ferrigno ressalta que a queda na realização de mamografias é um dos pontos mais preocupantes, já que o câncer de mama é o de maior incidência entre mulheres no Brasil.
“Aquelas mulheres que faziam mamografia e ultrassom todo ano para detectar um possível câncer de mama na fase inicial ficaram dois anos sem fazê-lo. Quando foram fazer agora, encontraram um tumor em fase mais avançada do que estaria se tivesse sido detectado há um ou dois anos. Isso representa a impossibilidade de essa paciente ficar curada”, afirma o médico.
Nesse sentido, os dados do Radar do Câncer revelam que o número de pessoas que chegam ao consultório com o tumor em estágio avançado também cresceu. Na comparação entre 2019 e 2021, por exemplo, houve um aumento de 12% em relação ao câncer de mama, 5% do câncer de próstata e de 11% sobre os casos de câncer da glândula tireoide.
A queda na realização de exames preventivos tem impacto menor para os casos de câncer de próstata, já que é um tipo de tumor de evolução mais lenta, segundo o oncologista, diferentemente do câncer de mama.
“A parte preventiva do câncer de próstata é importante porque, quanto mais precoce é o diagnóstico, menor é a intensidade do tratamento. Isso não muda o tempo de vida do paciente. Um caso que seria resolvido com cirurgia e radioterapia agora está mais avançado e será necessário introduzir outros tratamentos, como quimioterapia ou bloqueio de hormônios. É nisso que ele sai prejudicado”, afirma Ferrigno.
Alguns tipos de câncer, mesmo se não diagnosticados na fase inicial, podem ser controlados com outros tratamentos, mas essa não é a realidade para todos os tipos de tumor, de acordo com Ferrigno.
Tumores cerebrais de alto grau, cânceres no trato gastrointestinal como de estômago, esôfago e pâncreas, quando passam de determinada fase, perdem, de acordo com o oncologista, qualquer chance de cura.
Já para linfomas, alguns tipos de câncer de mama ou de pulmão é possível reverter a gravidade e aumentar a sobrevida do paciente com novos tratamentos.
“Graças ao avanço de novas medicações, é possível contornar algumas doenças oncológicas, mas isso seria à custa de maior toxicidade no tratamento, mas com possibilidade de ser eficiente para a cura. Depende muito do tipo de câncer. Com a imunoterapia, algo que está crescendo muito, é possível resgatar alguns desses pacientes”, afirma o médico.
A imunoterapia, conforme explica Ferrigno, tem sido importante para aumentar a sobrevida de pacientes com metástase — estágio em que o tumor se espalha para outras áreas do organismo. Vale destacar que a falta do diagnóstico precoce e a interrupção do tratamento são fatores que facilitam essa propagação do tumor.
“Hoje temos visto pacientes com metástase vivendo muito mais. O melanoma, por exemplo, mudou muito a curabilidade e o tempo de vida graças à imunoterapia. Antes, pacientes com metástase viviam dois, três meses, hoje eles vivem cinco, dez anos. Câncer de mama é outro exemplo: há pacientes com metástase que vivem15 anos porque algumas drogas estão controlandoa evolução”, afirma o médico.
É a variedade nas opções de tratamento que também possibilita que o câncer se torne uma doença crônica para algumas pessoas, segundo o oncologista, que conseguem viver cada vez mais com a doença controlada.
“Às vezes o paciente não é curado, mas o câncer vai se tornando como se fosse pressão alta, diabetes, que também não têm cura, mas é possível ir compensando e tratando os pacientes”, destaca Ferrigno.
R7