Desigualdade educacional aumenta em 58% dos municípios brasileiros

A desigualdade educacional aprofundou em 57,5% dos municípios brasileiros entre 2015 e 2019. Nessas cidades, a diferença de desempenho dos estudantes entre escolas com maior e menor rendimento aumentou mais do que o esperado para o período.

Os dados são de um levantamento feito pelo Todos pela Educação, que comparou os resultados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) entre a média do grupo de 10% das escolas com maior e com menor desempenho em cada município.

O estudo analisou os dados das escolas das redes municipais nos anos iniciais do ensino fundamental (do 1º ao 6º ano). As prefeituras são responsáveis pela matrícula de 70% dos 15 milhões de estudantes nessa etapa da educação.


Na maior parte das cidades em que a desigualdade aumentou, o que se verificou foi que as escolas que já tinham Ideb mais baixo em 2015 não conseguiram melhorar o desempenho ou atingir a meta estabelecida para 2019, enquanto, as unidades com maior índice conseguiram melhorar ainda mais seus resultados.


O Ideb é o principal termômetro da educação brasileira e é calculado a cada dois anos pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), órgão do Ministério da Educação. O indicador é calculado com as notas dos alunos nas provas de matemática e língua portuguesa e as taxas de aprovação escolar.


O aumento da desigualdade é verificado antes mesmo da pandemia, que, com a suspensão das aulas presenciais em todo o país, aprofundou ainda mais as dificuldades dos estudantes e escancarou a diferença de recursos entre eles. Por isso, os responsáveis pelo estudo alertam para a necessidade urgente de políticas para reduzir essas disparidades.

“Os indicadores pré-pandemia já eram bastante preocupantes e mostram que a desigualdade já tinha crescido. A tendência é de que, com a suspensão das aulas, ela aumente. É importante que os próximos prefeitos tenham consciência de que as escolas dos seus municípios são diferentes e tenham políticas pensando nisso”, diz Gabriel Côrrea, líder de políticas educacionais do Todos pela Educação.


Para ele, o importante é reconhecer e identificar as diferentes realidades dentro dos municípios, uma vez que dados gerais podem esconder os problemas nas escolas. No Ideb 2019, por exemplo, 79% dos municípios brasileiros tiveram melhora no indicador, mas em 58% deles houve aumento na desigualdade entre as unidades escolares.


Nas 26 capitais do país, ainda que 20 delas tenham melhorado o desempenho, apenas 15 conseguiram reduzir a desigualdade entre os grupos de escolas com os menores e maiores Ideb. Rio Branco, no Acre, que obteve a segunda maior média entre as capitais, é a que tem maior diferença entre seus colégios.


“Quando os dados são divulgados, muitos gestores públicos destacam e comemoram seu desempenho. No entanto, muitas vezes, esse avanço é ao custo de aumentar a desigualdade entre os estudantes”, diz Caio Sato, coordenador do núcleo de inteligência do Todos pela Educação.


Apesar de haver forte relação entre a desigualdade educacional e a econômica, o estudo destaca que são estados menos ricos que têm conseguido reduzir as disparidades.


O Ceará, por exemplo, é o estado com maior proporção de municípios (56,8%) que conseguiram diminuir as diferenças entre as escolas com maiores e menores notas. Estado mais rico do país, São Paulo só teve essa redução em 36,6% de suas cidades.


Para eles, o alerta é que, mesmo os municípios com melhora na média, precisam olhar para as desigualdades dentro de sua rede de ensino.


Em São Paulo, por exemplo, a rede municipal atingiu a noa 6 para os anos iniciais do fundamental. No entanto, no grupo de 10% das escolas com menor nota, a média do indicador foi de 5,3, ainda que a desigualdade tenha sido diminuída desde 2015.


“Avançar na média não é suficiente, é preciso avançar atendendo a todos os alunos. E o próximo ano coloca um cenário mais desafiador ainda porque são essas crianças que já estavam pra trás que mais devem ter sofrido os impactos da pandemia”, diz Côrrea.


Apesar dessas disparidades de ensino nas escolas municipais, nenhum candidato a prefeito de São Paulo apresenta em suas propostas de governo ações voltadas para reduzir as desigualdades de aprendizagem. Dois deles, Celso Russomano (Republicanos) e Arthur do Val, o Mamãe Falei (Patriota), ainda propõem uma política de bonificação para professores de escolas com maior desempenho.


“Políticas que premiam melhores resultados tendem a aumentar as desigualdades, porque se premia quem já estava na frente. Elas não ajudam quem está com mais dificuldade. O que ajuda é suporte para a gestão escolar, apoio pedagógico para o professor”, diz Côrrea.


O estudo também destaca que o fato de as desigualdades educacionais já serem tão presentes nos anos iniciais da educação básica mostra a necessidade de ações intersetoriais para apoiar os alunos.


“A escola não resolve tudo sozinha. É preciso políticas articuladas com saúde, assistência social para essas crianças e suas famílias.”

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